A
favela carioca, objeto de estudo do presente trabalho a partir do conceito
geográfico de lugar, e, mais especificamente o conceito de lugar turístico, é
percebida como um lugar, pois representa e nos mostra as relações múltiplas e
complexas.
A
favela como lugar turístico depende do tipo de relação que se cria com aquele
espaço vivido como atrativo turístico. Existem algumas experiências de turismo,
conhecidos como favela tours em que
se criam condições para essa convivência entre o morador e o visitante, e em
outras circunstâncias se criam bolhas
experienciais (conceito original de Broostin, 1964) que são completamente
desconectadas do contexto cultural e social das favelas.
Segundo
Freire-Medeiros (2007) existem atualmente diversas agências de turismo da
cidade do Rio de Janeiro que organizam passeios na favela da Rocinha. A oferta
é variada: há passeios “a pé, de van, de jipe ou de moto, de dia ou de noite,
com refeição incluída ou não”, e, ainda que com algumas diferenças, todos os
passeios oferecem atrativos “clássicos” comuns em todas as agências.
Dentre
esses atrativos clássicos estão as famosas “lajes” das favelas; a Praça dos
Artesões, localizada em um mirante dentro da favela; creches; lugares em que
são desenvolvidos trabalhos sociais; a escola de samba da Rocinha, etc. Também
são visitados pontos de vendas de artesanato, onde é possível o turista fazer
aquisição de souvenirs.
Um
grupo de pesquisa da Pontifícia Universidade Católica (PUC-RIO), fez uma
pesquisa de campo com os moradores da Rocinha, questionando sobre alguns
aspectos do favela tour. Os moradores
fizeram críticas incisivas aos guias de turismo que são contratados pelas
agências para levarem os turistas no passeio pela favela. Esses intermediários,
segundo os moradores, seriam responsáveis por fornecer informações distorcidas
ou contar histórias inexatas aos turistas que visitam a favela. Essas críticas
são mais fortes, pois os guias são praticamente as únicas pessoas que os
turistas têm algum contato durante a visita. Os únicos outros lugares que o
turista tem contato direto com o morador é quando compra algum souvenir ou no mirante da favela, que é
ao ar livre e o turista pode permanecer algum tempo livre. Ainda existe um
distanciamento muito grande entre o morador e o turista.
Segundo
a pesquisa realizada pelo SEBRAE-RJ, muitos moradores da Rocinha enxergam o
turismo na comunidade como prejudicial e estereotipado. Um exemplo disso é o
depoimento de um morador, Cláudio, presidente da União Pró Melhoramento dos
Moradores da Rocinha (UPMMR): “o turismo na Rocinha não gera um retorno social,
é um turismo que só vem explorar o narcotráfico, um turismo que hoje é tese de
mestrado em universidades no mundo inteiro, um turismo que a gente classifica
como um verdadeiro ‘safári de humanos’ onde não se tem regras, em que eles
negam, escondem toda a história bonita e de resistência que a comunidade
tem (...) esquecem todo
esse histórico e
vem aqui hoje fazer
esse turismo invasivo
(...). A Rocinha
está sendo vendida
no mundo inteiro e esse turismo não faz nada para combater essa miséria,
para combater esse
lixo, para estruturar
a comunidade. O
que eles querem é
isso, é explorar
a miséria” (SEBRAE-RJ,
2008, p.118, entrevista realizada
no dia 18 de julho de 2008).
Esse turismo que é entendido por
parte dos moradores da favela como deteriorante e inimigo, explora e não deixa
nenhum benefício na Rocinha. Como de fato ocorre. Parte das agências que são
responsáveis por organizar os favela
tours nas favelas da cidade do Rio de Janeiro não produzem nenhum tipo de
benefício à população local. Os impactos econômicos positivos gerados pelo
turismo nas favelas são mais perceptíveis aos artesãos que ganham a vida
vendendo souvenirs para turistas nos
pontos de venda de artesanato na favela.
O fato de uma favela ser um destino
turístico não representa necessariamente degradação espacial, ambiental,
cultural e identitária. Existem casos em que a exploração do lugar turístico
das favelas de maneira bem planejada estimula a valorização social e econômica
do lugar.
Segundo
SPAMPINATO (2009), um exemplo desses casos em que há benefícios para a
população residente é a CoopBabilônia, em que a consciência ambiental
juntamente com ações de solidariedade internacional podem construir laços
humanos estáveis, e impulsionar social e economicamente determinada comunidade.
Ou por exemplo a Favela Receptiva, em que o sentido identitário pode ser
estimulado e impulsionado por uma atividade turística, deixando ao anfitrião
seu espaço para livre expressão.
Como
dito anteriormente, ainda existem casos de turismo em favela em que a
teatralização da vida cotidiana dos moradores impera, transformando o lugar
turístico em um não-lugar turístico, como por exemplo o favela tour que ocorre na comunidade da Rocinha. O estudo de caso
adverte que para ser realmente benéfico para a população residente do lugar
turístico, o turismo não pode ser desenhado e projetado de fora e aplicado nas
favelas cariocas.
Lohanne Fernanda Ferreira
Monitora de Turismo e Desenvolvimento Cultural I e II
Referências:
FREIRE MEDEIROS, B. O Rio de
Janeiro que Hollywood
inventou. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar, 2002.
INSTITUTO VIRTUAL DE TURISMO. < www.ivt-rj.net
> Acesso em: 25 de Junho de 2012.
SPAMPINATO, Elisa. Turismo em favelas cariocas e o
desenvolvimento situado: a possibilidade do encontro em suas iniciativas
comunitárias. Tese de Mestrado, COPPE, 2009.
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